Cuidados na Cobrança de dívidas decorrentes de contratos de Locação de Espaços em Shopping Centers11/8/2020 Esta semana me pediram uma consulta a respeito da cobrança de dívidas decorrentes de contrato de aluguel de espaços em shopping centers. Como trata-se de um caso extremamente interessante e pouco abordado, resolvi compartilhar com os colegas o resultado do estudo que desenvolvi a respeito do tema: 1. Despesas envolvidas no contrato de locação
Nos shopping centers existem dois fundos de comércio, quais sejam, do lojista e outro do próprio shopping, que funciona como polo de atração de clientela em razão das facilidades e comodidades que oferece. Esta disparidade em relação às locações comerciais comuns acarreta na necessidade de conferir tratamento jurídico diverso aos contratos de aluguel de espaços em shopping centers. Dentre diferenças que se verifica no regime jurídico desses contratos estão a forma pela qual se cobra o lojista pelo uso do espaço e as despesas agregadas aos alugueres, vamos a elas:
Nas locações comuns, conforme o Artigo 22 da Lei do Inquilinato inciso X, incumbe ao locador o pagamento as despesas extraordinárias, sendo estas, conforme Parágrafo único, conceituadas como aquelas que não se refiram aos gastos rotineiros de manutenção do edifício: Art. 22. O locador é obrigado a: X – pagar as despesas extraordinárias de condomínio. Parágrafo único. Por despesas extraordinárias de condomínio se entendem aquelas que não se refiram aos gastos rotineiros de manutenção do edifício, especialmente: a) obras de reformas ou acréscimos que interessem à estrutura integral do imóvel; b) pintura das fachadas, empenas, poços de aeração e iluminação, bem como das esquadrias externas; c) obras destinadas a repor as condições de habitabilidade do edifício; d) indenizações trabalhistas e previdenciárias pela dispensa de empregados, ocorridas em data anterior ao início da locação; e) instalação de equipamento de segurança e de incêndio, de telefonia, de intercomunicação, de esporte e de lazer; f) despesas de decoração e paisagismo nas partes de uso comum; g) constituição de fundo de reserva. No entanto, como trata-se de contrato de locação com regime jurídico diverso, o artigo 54 Parágrafo único da mesma lei autorizou que fossem cobradas do locatário todas as despesas contidas no Parágrafo único do artigo 22, exceto as das alíneas a, b, d e despesas com obras ou substituições de equipamentos que impliquem em modificar o projeto ou memorial descritivo da data do habite-se: Art. 54. Nas relações entre lojistas e empreendedores de shopping center , prevalecerão as condições livremente pactuadas nos contratos de locação respectivos e as disposições procedimentais previstas nesta lei. § 1º O empreendedor não poderá cobrar do locatário em shopping center : a) as despesas referidas nas alíneas a , b e d do parágrafo único do art. 22; e b) as despesas com obras ou substituições de equipamentos, que impliquem modificar o projeto ou o memorial descritivo da data do habite – se e obras de paisagismo nas partes de uso comum. Acresça-se que estas despesas também devem estar previstas em orçamento, tal como estipulado no parágrafo 2 do mesmo dispositivo: § 2º As despesas cobradas do locatário devem ser previstas em orçamento, salvo casos de urgência ou força maior, devidamente demonstradas, podendo o locatário, a cada sessenta dias, por si ou entidade de classe exigir a comprovação das mesmas. Isto é relevante por que ,enquanto os alugueres, o percentual a título de dúplice cobrança e o fundo de participação então perfeitamente quantificados no instrumento contratual, as despesas extraordinárias os encargos não porquanto costumam ser variáveis. E é a esta particularidade que se deve atentar no momento da execução. 2. Execução do Contrato de Aluguel É requisito para o processo executivo, conforme artigo 783 do NCPC, que a dívida funde-se em título de obrigação certa, líquida e exigível. Esta dívida é representada sempre por um titulo, que é um documento ao qual a lei atribui força executiva e que certifica um ato jurídico atribuindo alguém um dever de prestar líquido, certo e exigível. O Contrato de aluguel é um titulo executivo extrajudicial, portanto pode ser executado sem seja necessário prévio processo de conhecimento. No entanto é necessário que atente-se para o atendimento do requisito de liquidez. Isso por que, como explicado no primeiro tópico, alguma das despesas previstas no contrato estão perfeitamente quantificadas, de modo que, para chegar o valor a ser executado, basta que sejam realizados cálculos simples. É o caso de despesas como o aluguel mínimo (caso em que não houve apuração do lucro das vendas dos lojistas/caso em que o lucro apurado está abaixo do mínimo estabelecido em contrato), aluguel em dobro em dezembro e fundo de participação. Entretanto, outros valores como encargos e despesas extraordinárias que estão previstas no instrumento contratual e não quantificadas precisam estar perfeitamente individualizadas e comprovadas por que são variáveis, caso contrário o título executivo, ao menos quanto a esta parte, será ilíquido. É assim que tem entendido a jurisprudência: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – CRÉDITO DECORRENTE DE CONTRATO DE LOCAÇÃO DE LOJAS EM SHOPPING CENTER – ALUGUEL, ENCARGOS E FUNDO DE PROMOÇÃO E PROPAGANDA – OBRIGAÇOES LÍQUIDAS – IMPRESCINDIBILIDADE. O crédito decorrente de aluguel de imóvel e encargos acessórios, desde que comprovado documentalmente, é título executivo extrajudicial, nos exatos termos do artigo 585, V, do Código de Processo Civil/73. Todavia, ainda que a um título seja atribuído, por lei, força executiva, não poderá embasar uma execução se lhe faltarem os requisitos da certeza, da exigibilidade e da liquidez. Não se há de falar em iliquidez em relação aos aluguéis, fundo de promoção e multa rescisória, se a apuração dos valores de tais parcelas do débito executado depende de simples cálculos aritméticos. Considerando que o valor dos encargos previstos no contrato, denominados de “encargos decorrentes da locação”, são variáveis e demandam cálculos complexos, impõe-se reconhecer que carece de liquidez o título executivo nessa parte, assim devendo aludida parcela da dívida ser decotada do valor total executado. APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0079.10.611463-4/001 – COMARCA DE CONTAGEM – APELANTE (S): CONDOMÍNIO CONTAGEM BIGSHOPPING – APELADO (A)(S): JUAREZ OLIVEIRA AZEVEDO COELHO, IVETE PEREIRA LIMA ROMERO, TOMÉ JOSÉ COELHO, ILMA OLIVEIRA DE AZEVEDO COELHO, THAÍS ROBERTA LIMA ROMERO COELHO, USA TECNOLOGIA LTDA E OUTRO (A)(S), JOSE ROBERTO GOMES ROMERO CONTRATO DE LOCAÇÃO EM SHOPPING CENTER – “DESPESAS COMUNS” QUE, EMBORA LÍCITAS, NÃO TIVERAM SEUS RESPECTIVOS VALORES ESTABELECIDOS EM CONTRATO NEM FORAM DEVIDAMENTE COMPROVADAS NA EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – ILIQUIDEZ PARCIAL DO TÍTULO RECONHECIDA. IGUAL RACIOCÍNIO INAPLICÁVEL AOS VALORES COBRADOS A TÍTULO DE “FUNDO DE PROMOÇÃO E PROPAGANDA” – MENÇÃO EXPRESSA DE SEU VALOR NO CONTRATO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO, COM ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. (TJPR – 11ª C.Cível – AC – 1592546-7 – Curitiba – Rel.: Mario Nini Azzolini – Unânime – – J. 12.04.2017) 3. Conclusão Em razão de todas essas considerações o locador deve durante a locação: 1. Assegurar que todas as despesas estejam previstas em orçamento 2. Estejam demonstradas E no momento da execução elas estejam individualizadas e comprovadas sob pena de não conseguir executá-las. Referências Direito imobiliário – Teoria e prática/Luiz Antonio Scavone Junior. – 9.ª ed. – rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro : Forense, 2015. Venosa, Sílvio de Salvo Lei do inquilinato comentada: doutrina e prática: Lei n2 8.245, de 18-10-1991 / Sílvio de Salvo Venosa. – 13. ed. – São Paulo: Atlas, 2014. Souza, Sylvio Capanema de, 1938- A lei do inquilinato comentada I Sy1vio Capanema de Souza. – 8.• ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2012. Lei de Locações Jurisprudência
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AutorNayla Caroline Paganini é advogada formada pela PUCSP em 2010. Juíza do Tribunal Arbitral, advogada e consultora. Trabalha nas áreas de direito público e direito privado. HistóricoCategorias
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